Como desligar a própria consciência
Praticantes experientes de meditação conseguem modular voluntariamente seu estado de consciência durante a prática.
Em outras palavras, esses meditadores possuem a capacidade incomum de induzirem um vazio momentâneo de consciência modulando em larga escala a própria atividade cerebral - os médicos e cientistas só conseguem induzir algo semelhante em pacientes usando drogas e anestesias.
São várias situações em que o ser humano pode perder a consciência, desde uma anestesia ou um caso grave de concussão cerebral, até intoxicação, epilepsia, convulsão ou outro episódio de desmaio/síncope, tipicamente marcados pela falta de fluxo sanguíneo para o cérebro, eventualmente provocando a perda total de consciência.
Contudo, textos sagrados milenares de várias tradições religiosas trazem instruções de como induzir uma cessação da consciência de modo voluntário. Esses eventos extraordinários de cessação, chamados nirodha na terminologia budista tibetana, podem acontecer durante a prática intensiva de meditação. O praticante perde brevemente a consciência mas, quando desperta, experimenta mudanças significativas na forma como a sua mente funciona, incluindo uma sensação repentina de profunda clareza mental e perceptiva.
Mesmo com esse conhecimento milenar, contudo, este é um tema difícil de estudar cientificamente porque poucos praticantes chegam ao nível de conseguirem atingir o nível de meditação em que ocorrem as cessações, que também são difíceis de prever.
Uma equipe de pesquisadores da Austrália, Estados Unidos e Países Baixos decidiu enfrentar o desafio, uma vez que a capacidade de "desligar" a consciência pode ter implicações relevantes para nossa compreensão de como a cognição funciona.
Monitoramento objetivo
Avijit Chowdhury e seus colegas conseguiram recrutar um praticante experiente de meditação que mostrou ser capaz de induzir múltiplos eventos de cessação e descrevê-los à medida que estes surgiam ao longo de repetidas sessões de meditação. E, enquanto ele fazia calmamente sua prática, os cientistas usaram todos os seus aparatos tecnológicos para tentar ver o que acontecia em seu cérebro.
A equipe recorreu a uma abordagem neurofenomenológica, na qual as descrições das cessações em primeira pessoa foram correlacionadas com os dados objetivos obtidos por neuroimagens do cérebro. Ou seja, o praticante de meditação avaliou sistematicamente seus processos mentais e fisiológicos relevantes para as cessações (contexto, entrada, evento, saída, efeitos posteriores) conforme os experienciou, e essas avaliações foram usadas para agrupar e selecionar eventos para análise posterior baseada em eletroencefalogramas (EEG).
A análise espectral dos dados EEG relativos aos 37 eventos de cessação, documentados em 29 sessões, permitiu relacionar as interrupções com medidas objetivas e intrínsecas da atividade cerebral, associadas à consciência e ao funcionamento psicológico de alto nível, confirmando por critérios objetivos que os meditadores experientes de fato podem "desligar" voluntariamente a própria consciência.
"Estes resultados fornecem provas iniciais da capacidade de praticantes experientes de meditação modularem voluntária e profundamente o seu estado de consciência e lançam as bases para mais estudos sobre estados únicos utilizando abordagens neurocientíficas e empíricas," disse o professor Matthew Sacchet, coordenador da pesquisa.
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