08/10/2010

Lítio protege contra doença de Alzheimer

Júlio Bernardes - Agência USP
Lítio protege contra doença de Alzheimer
O lítio mostrou um efeito protetor contra o Mal de Alzheimer em idosos com transtorno cognitivo leve, que têm maiores riscos de desenvolver a doença.
[Imagem: Ag.USP]

Efeito protetor do lítio

Uma pesquisa realizada no Instituto de Psiquiatria (IPq) da USP comprovou o efeito protetor do lítio para prevenir o aparecimento da doença de Alzheimer.

A ação protetora foi verificada em idosos com transtorno cognitivo leve, que têm maiores riscos de desenvolver a doença.

O trabalho deverá ser publicado em uma das próximas edições da revista científica British Journal of Psychiatry.

Entre pacientes com transtorno cognitivo leve, cerca de 10% desenvolvem o Alzheimer, um ano após manifestarem sinais de perda de memória.

"Um grupo de idosos recebeu uma dose diária de 300 miligramas de lítio, menor do que a utilizada em casos de transtorno bipolar, e outro um grupo controle que recebeu apenas um placebo", conta o médico Wagner Gattaz, do IPq, que coordena a pesquisa junto com Orestes Forlenza, também do IPq.

"Um ano depois, o percentual de pessoas que tomaram lítio e desenvolveram a doença era significativamente menor do que no grupo controle, o que demonstra um efeito protetor," relata ele.

Lítio no cérebro

A doença de Alzheimer é caracterizada por dois processos biológicos, o aumento da produção de beta-amiloide, proteína que se deposita em placas no cérebro (placas senis) e a hiperfosforilação da proteína TAU, um processo que destrói o esqueleto das células.

Ambos os processos levam a morte dos neurônios. "O lítio inibe a atividade da enzima GSK 3-Beta, que fosforila a TAU e também participa na produção de beta-mieloide. Portanto o lítio seria, potencialmente, o antagonista ideal contra os dois processos", destaca o médico.

De acordo com Gattaz, os tratamentos existentes apenas retardam a progressão da doença, sem impedir todavia a sua progressão.

"Embora os sintomas da doença de Alzheimer, geralmente surjam após a sexta década de vida, o processo biológico da perda de neurônios começa algumas décadas mais cedo", observa. "Por isso há a necessidade de desenvolver uma medicação que possa prevenir precocemente o surgimento da doença."

Lítio como prevenção

No prosseguimento da pesquisa, os cientistas agora realizarão experimentos em animais geneticamente modificados para verificar se o lítio, ingerido em doses baixas durante toda a vida, pode prevenir o surgimento da doença de Alzheimer.

"Esses animais possuem uma modificação genética que os leva a produzir o beta-amiloide", aponta Gattaz. "Eles receberão lítio desde o nascimento e serão acompanhados por toda a vida para saber se haverá o desenvolvimento da doença."

O professor ressalta que se os testes com animais e os ensaios clínicos com seres humanos forem bem-sucedidos, seria possível usar o lítio na prevenção da doença.

"O Brasil é um dos maiores produtores de lítio do mundo", afirma. "Talvez um dia possa ser possível prevenir a doença de Alzheimer com a ingestão diária de doses mínimas de lítio durante toda a vida, por exemplo na água potável, da mesma forma que a adição de flúor na água diminui a incidência de cáries, ou a adição de iodo no sal de cozinha previne doenças da tireoide."

Transtorno cognitivo leve

O médico lembra que dois estudos antecederam os experimentos com os portadores de transtorno cognitivo leve.

No primeiro, idosos com transtorno bipolar, doença em que o lítio é utilizado para estabilizar o humor, foram comparados com outros que não receberam a medicação.

"Entre os pacientes que tomaram lítio, a incidência de Alzheimer foi cinco vezes menor do que entre os que não tomaram", conta. O trabalho foi publicado em 2007 no British Journal of Psychiatry.

No estudo seguinte, foi investigado o mecanismo pelo qual o lítio diminui a atividade da GSK 3-Beta. "O mais provável é que o lítio inibe a expressão do gene da enzima", diz o pesquisador do IPq. O trabalho é descrito em um artigo no European Archives of Psychiatry and Clinical Neuroscience, publicado em 2008.

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