Terapia neoadjuvante
O tratamento padrão para câncer de reto atualmente inicia-se com a chamada terapia neoadjuvante, que consiste em aplicar quimioterapia e radioterapia para reduzir o tamanho do tumor.
Em seguida é realizada uma cirurgia invasiva que, na maioria dos casos, tem um forte impacto negativo na qualidade de vida do paciente.
Uma parcela significativa dos pacientes reponde tão bem à terapia neoadjuvante que poderia até mesmo ser dispensada da cirurgia.
Agora, cientistas brasileiros estão trabalhando no desenvolvimento de um teste molecular com o objetivo de auxiliar os médicos a identificar esses casos.
O trabalho está sendo realizado por cientistas do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, do Centro de Oncologia Molecular do Hospital Sírio-Libanês e do Instituto Angelita & Joaquim Gama.
Segundo Anamaria Aranha Camargo, diretora do Instituto Ludwig, apenas 3% dos pacientes não respondem à terapia neoadjuvante e são submetidos desnecessariamente aos efeitos adversos da quimioterapia e da radioterapia.
No outro extremo, porém, há 30% que respondem tão bem que nem sequer precisariam ser operados.
"Esse número pode chegar a 60% dependendo do protocolo usado. Precisamos de ferramentas mais eficientes para diferenciar esses casos e fazer um tratamento mais personalizado", disse Anamaria.
Hoje, a avaliação dos resultados da terapia neoadjuvante é feita por meio de análises sorológicas, toque retal e exames de imagem, como ultrassom e tomografia.
Mas nenhuma dessas técnicas é suficiente para dar ao médico a certeza de que o tumor desapareceu. Na dúvida, os cirurgiões preferem operar.
Dependendo da área afetada, a cirurgia pode prejudicar a função sexual e causar incontinência urinária e fecal.
Teste de alterações cromossômicas
A boa notícia, porém, é que os avanços na área de genômica estão permitindo a identificação de biomarcadores e o desenvolvimento de exames personalizados que poderão livrar boa parte dos pacientes desse sofrimento.
O grupo de pesquisadores já sequenciou o genoma do tumor de sete pacientes e identificou todos os rearranjos cromossômicos presentes em cada caso.
Em seguida, foram desenvolvidos ensaios moleculares que permitem rastrear a presença dessas alterações cromossômicas em amostras de sangue.
"Se o exame molecular detectar a presença do DNA alterado, é sinal de que ainda há células tumorais produzindo e liberando esse material na corrente sanguínea. Já se o resultado for negativo, o paciente poderá repetir o teste de tempos em tempos para ter certeza de que não houve uma recidiva", explicou Anamaria.
Exame eficaz
O método já foi testado em dois dos sete pacientes que tiveram o genoma sequenciado.
"Como controle positivo, escolhemos um caso em que o exame clínico havia confirmado que o tumor continuava presente e o teste molecular, de fato, conseguiu rastrear o DNA tumoral no sangue", contou Anamaria.
Como controle negativo, os pesquisadores aplicaram o teste molecular em um paciente que já havia sido operado e a biópsia não havia revelado células tumorais. O resultado do exame molecular também foi negativo, reforçando a hipótese de que a cirurgia foi desnecessária.
"Começamos pelos extremos e agora vamos testar os pacientes em que haveria dúvida. Se conseguirmos reunir evidências de que o método tem, de fato, utilidade clínica, o próximo passo é testá-lo em uma amostra maior", disse Anamaria.
A grande dificuldade, segundo a pesquisadora, é que nos casos de câncer retal não existe um padrão recorrente de rearranjos cromossômicos. "Alguns pacientes podem ter dez rearranjos e outros podem ter mais de cem. Com a tecnologia de sequenciamento disponível hoje a um custo relativamente baixo, é possível analisar cada um dos tumores e desenhar os ensaios moleculares de forma individualizada", disse.
Assinatura gênica
Paralelamente, os cientistas analisam o perfil de expressão gênica em outra amostra de 30 pacientes para tentar identificar um conjunto de genes capaz de indicar antecipadamente a resposta ao tratamento neoadjuvante.
"Já achamos uma assinatura gênica capaz de dividir os pacientes em dois grupos - aqueles que respondem completamente ao tratamento e aqueles que têm resposta incompleta. Mas, para ter certeza, precisamos fazer a validação em um grupo diferente de voluntários", explicou Anamaria.
Segundo a pesquisadora, a estimativa é que no início de 2013 o sequenciamento de um genoma humano completo poderá ser feito a um custo de US$ 1 mil.
"Ainda é uma metodologia cara e poderá levar um tempo até ser incorporada ao Sistema Único de Saúde. Mas é um avanço importante e, como toda tecnologia nova, leva um tempo para ser incorporada e socializada", disse.
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