08/03/2022

Cérebro-no-chip desmente origem genética de doença rara do desenvolvimento

Redação do Diário da Saúde
Cérebro-no-chip desmente origem genética de doença rara do desenvolvimento
Acreditava-se que a doença era genética porque o processo não aparece no cérebro de cobaias.
[Imagem: Knoblich/IMBA]

Doença tipicamente humana

Com a ajuda de pequenos "cérebros artificiais", cientistas comprovaram que a esclerose tuberosa, uma desordem rara do neurodesenvolvimento, surge no próprio desenvolvimento, e não apenas como uma herança genética.

A descoberta demonstra que a patologia das doenças que afetam o cérebro humano só pode ser bem compreendida usando como modelo os próprios humanos, ou, quando isso não for possível, os organoides cerebrais. Apesar de serem amostras minúsculas de um órgão, esses miniórgãos são feitos a partir de células humanas, e não de animais.

Com esses modelos de laboratório derivados de pacientes, a equipe identificou a origem da doença em células progenitoras específicas dos humanos, que não têm equivalentes nas cobaias estudadas até agora, razão pela qual essa rota desenvolvimental nunca havia sido observada.

Complexo da Esclerose Tuberosa

O Complexo da Esclerose Tuberosa (CET) tem sido descrito há muito tempo como uma doença de base genética, mas sempre com base em dados obtidos em modelos animais.

Em muitos pacientes afetados, o CET se manifesta na forma de epilepsia grave e sintomas psiquiátricos como autismo e dificuldades de aprendizagem. Morfologicamente, o CET é caracterizado por sinais bem descritos frequentemente encontrados no cérebro dos pacientes. Entre eles estão os tumores benignos presentes em uma área definida do cérebro, bem como lesões no córtex cerebral, ou "manto cerebral", chamados de "tubérculos".

"Nossas descobertas sobre a causa raiz do CET nos levaram a um tipo de célula progenitora específica do cérebro humano. Isso explica por que a patologia dessa doença não pôde ser bem estabelecida com outros modelos de laboratório," explicou o professor Jurgen Knoblich, do Instituto de Biotecnologia Molecular da Áustria.

Cérebro-no-chip desmente origem genética de doença rara do desenvolvimento
Organoide de paciente com esclerose tuberosa mostra tumor nodular projetando-se da superfície do organoide aos 110 dias de idade.
[Imagem: Knoblich/IMBA]

Células CLIP

A equipe cultivou organoides cerebrais de vários pacientes afetados pela esclerose tuberosa, o que permitiu investigar mecanismos moleculares e celulares que aconteciam nos cérebros dos pacientes em algum momento durante o desenvolvimento.

"Com essa abordagem, descobrimos que, como nos cérebros dos pacientes, os organoides desenvolveram tumores e tinham áreas desorganizadas, que se assemelhavam aos tubérculos dos pacientes," explicou o pesquisador Oliver Eichmüller. No entanto, recapitular a fisiopatologia de uma doença é apenas o primeiro passo para designar o culpado: "Aprofundando as causas, descobrimos que ambas as anormalidades foram desencadeadas pela proliferação excessiva de um tipo de célula específico do cérebro humano," acrescentou Eichmüller.

Estas células foram denominadas CLIP, sigla em inglês para "progenitores de interneurônios caudais tardios". São células encontradas durante o estágio de desenvolvimento do cérebro humano, mas não em animais, como camundongos.

"Nosso estudo mostra que nosso cérebro é muito complexo - muito mais complexo do que o cérebro da maioria dos animais," destacou a professor Nina Corsini, membro da equipe.

Os cientistas ainda traçaram paralelos com outras doenças neurodesenvolvimentais e neuropsiquiátricas e com doenças malignas que afetam o cérebro humano, levantando a hipótese que elas também possam ser causadas por processos de desenvolvimento específicos do ser humano.

Checagem com artigo científico:

Artigo: Amplification of human interneuron progenitors promotes brain tumors and neurological defects
Autores: Oliver L. Eichmüller, Nina S. Corsini, Ábel Vértesy, Ilaria Morassut, Theresa Scholl, Victoria-Elisabeth Gruber, Angela M. Peer, Julia Chu, Maria Novatchkova, Johannes A. Hainfellner, Mercedes F. Paredes, Martha Feuchtand, Jürgen A. Knoblich
Publicação: Science
Vol.: 375, Issue 6579
DOI: 10.1126/science.abf5546
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