04/09/2017

Célula tumoral produz metástase quando passa fome, diz pesquisador

Com informações da Agência Fapesp
Célula tumoral produz metástase quando passa fome, diz pesquisador
Apesar de ser um processo dramático para o ser humano, biologicamente a metástase é um processo muito ineficiente, exigindo milhares de células tumorais circulando para que algumas poucas consigam estabelecer uma nova colônia com sucesso, explicou o pesquisador.
[Imagem: Sriram Subramaniam/NCI]

Modelo do câncer

O pesquisador britânico Colin Goding está convencido de que o mesmo fator que motivou o primeiro ser vivo unicelular a se movimentar pela Terra - há mais de 3 bilhões de anos - também é a razão pela qual algumas células tumorais se separam do tumor primário para colonizar outras partes do corpo: a busca por comida.

Em seu laboratório, situado no Instituto Ludwig de Pesquisa do Câncer, vinculado à Universidade de Oxford, no Reino Unido, ele demonstrou em experimentos com culturas de melanoma humano que a falta de nutrientes desativa o maquinário de proliferação celular e faz com que as células tumorais adquiram um fenótipo invasivo.

"Nossa estimativa é que a mesma lógica funcione para a maioria dos tipos de câncer e, talvez, possamos encontrar meios de manipular esse mecanismo de sobrevivência celular para obter benefícios terapêuticos", disse Goding durante o evento Workshop on Melanoma Models, realizado em São Paulo, quando o pesquisador contou que está usando o melanoma como um modelo para entender a progressão do câncer como um todo.

"É um ótimo modelo porque conseguimos visualizar todos os estágios da doença. Podemos perceber quando as células produtoras de pigmento começam a invadir outros tecidos e formar metástases. Já em outros tipos de tumor, como pulmão ou pâncreas, quando o paciente apresenta sintomas e procura um médico a doença já se espalhou," comentou.

Comportamento celular

Outro fator que tornou o melanoma um modelo interessante para o estudo do câncer, segundo Goding, foi a identificação, há mais de uma década, de um gene chamado BRAF, que se encontra alterado em metade dos casos da doença - emitindo estímulos para a proliferação descontrolada das células.

"Em poucos anos surgiram drogas capazes de inibir especificamente essa forma ativa do gene BRAF com efeitos dramáticos. Pacientes com múltiplas metástases respondiam muito bem. Porém, após alguns meses, as células se tornavam resistentes. Nossa pergunta então foi: por que essa resistência surge e o que podemos fazer a respeito?"

Os estudos mais recentes têm mostrado que a resistência do melanoma ao tratamento está relacionada com a existência, dentro de um mesmo tumor, de subpopulações de células com fenótipos diferentes. Ou seja, embora possuam a mesma estrutura genética, elas se comportam de forma distinta.

"Algumas podem estar mais diferenciadas e se comportar como o tecido de origem [células produtoras de melanina], outras podem estar se proliferando rapidamente e fazendo o tumor crescer, outras podem estar com o ciclo mais lento e fenótipo invasivo e outras se tornam dormentes e permitem que, mesmo após uma terapia bem-sucedida, a doença reapareça muitos anos depois", explicou Goding.

Célula tumoral produz metástase quando passa fome, diz pesquisador
"Se encontrarmos um mecanismo para eliminar a dormência, poderemos reduzir ainda mais o porcentual de células que consegue escapar do tumor primário, sobreviver e formar metástase," disse Goding.
[Imagem: University of Oxford]

Evitar a metástase

Um dos objetivos do grupo britânico, portanto, tem sido compreender os fatores que levam ao surgimento desses diferentes fenótipos. Segundo Goding, aspectos do microambiente tumoral, como a disponibilidade de nutrientes, oxigênio e a interação com sinais emitidos pelo sistema imune, são fundamentais para a transformação.

A hipótese levantada pelo britânico é que, diante de uma situação de escassez de nutrientes, ativa-se em parte das células tumorais um mecanismo de sobrevivência que as faz migrar para procurar comida em outro local.

Experimentos feitos por Goding com leveduras e também com células de melanoma confirmaram que existe um mecanismo de sobrevivência celular conservado ao longo da evolução. Quando passa fome, a célula reduz sua demanda por nutrientes para se adequar à oferta. Isso significa desativar os processos biológicos necessários para a síntese de proteínas e para a formação de novas células.

Porém, quando a célula tumoral consegue migrar para um novo ambiente, onde há abundância de nutrientes e ausência dos sinais imunes que induzem a pseudodesnutrição, ela volta a se proliferar para formar uma nova colônia.

"Se conseguirmos enganar as células para fazer com que acreditem que os sinais de estresse já foram embora, o maquinário de fazer novas células volta a ficar ativo e elas vão morrer porque a demanda por nutrientes vai exceder a oferta," avaliou.

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