27/03/2023

Uma molécula que espalha emoções há milhões de anos

Redação do Diário da Saúde
Uma molécula que espalha emoções há milhões de anos
Se é bem óbvio que um comportamento desonesto prejudica a própria pessoa, estudos já mostraram que fingir emoções no trabalho não é uma boa ideia.
[Imagem: CC0 Public Domain/Pixabay]

Contágio emocional

Quando alguém nos sorri, o mais natural é sorrirmos de volta. Por outro lado, se convivemos com alguém que está irritado ou estressado, acabamos por absorver essas emoções negativas.

A esta tendência para sincronizarmos as nossas emoções com as dos outros dá-se o nome de contágio emocional.

Dado que este comportamento social não é exclusivo dos humanos, a explicação científica atual para isso é que o contágio emocional aumenta a probabilidade de sobrevivência: Este fenômeno permite que o medo se espalhe rapidamente ante uma ameaça, por exemplo.

Ao mesmo tempo, ao imitar emoções, conseguimos estabelecer vínculos sociais com os outros, o que também reforça a cooperatividade e, mais uma vez segundo os cientistas, aumenta a taxa de sobrevivência.

Agora, pesquisadores portugueses conseguiram rastrear no cérebro os mecanismos que usamos para sincronizar emoções, mostrando que esse processo remonta ao grupo mais antigo de vertebrados, os peixes - evolutivamente, acreditamos que os peixes tenham sido os primeiros vertebrados a povoarem a Terra.

Emoções de peixes

Ibukun Akinrinade e seus colegas do Instituto Gulbenkian de Ciência queriam saber se, tal como os humanos e outros mamíferos, o peixe-zebra também necessita da oxitocina para adotar as emoções dos outros - o neuro-hormônio oxitocina, ou ocitocina, é bem conhecido por promover laços sociais e gerar sentimentos prazerosos.

Os experimentos mostraram que, quando veem um cardume, em outro tanque transparente junto ao deles, com movimentos de alarme ante um perigo, os peixes-zebra espelham o comportamento. Ao contrário, peixes com modificações genéticas na oxitocina ou nos seus receptores continuam a nadar calmamente mesmo quando veem os seus vizinhos em apuros. Isto demonstra que esta molécula é necessária para que o medo e os comportamentos a ele associados se propaguem, por exemplo, quando um dos membros do cardume foi atacado.

Mas como provar que os peixes reconhecem especificamente o medo nos seus semelhantes, e que não estão simplesmente copiando o seu modo de nadar? "Percebemos que os observadores se aproximam do cardume que observaram em alerta mesmo quando este já voltou a nadar normalmente, enquanto os peixes com mutações preferem manter-se próximos do grupo que esteve sempre em um estado neutro," explicou Kareklas. Ou seja, através da oxitocina, os peixes-zebra decodificam e imitam o estado emocional do cardume vizinho, passando a comportar-se de forma semelhante.

Mas a oxitocina não é o único fator comum entre peixes e humanos no que diz respeito ao contágio emocional. "As áreas cerebrais que os peixes-zebra usam para reconhecer e sintonizar emoções são equivalentes a algumas que nós humanos também usamos," explicou o professor Rui Oliveira. É por isto que os cientistas gostam de usar esses peixes como modelo para estudar comportamentos sociais e os mecanismos neurais subjacentes.

Checagem com artigo científico:

Artigo: Evolutionarily conserved role of oxytocin in social fear contagion in zebrafish
Autores: Ibukun Akinrinade, Kyriacos Kareklas, Magda C. Teles, Thais K. Reis, Michael Gliksberg, Giovanni Petri, Gil Levkowitz, Rui F. Oliveira
Publicação: Science
Vol.: 379, Issue 6638 pp. 1232-1237
DOI: 10.1126/science.abq515
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