Células-tronco hematopoiéticas
Duas pesquisas em andamento na Universidade de São Paulo (USP) estão fazendo avançar o uso da terapia celular para o tratamento do diabetes tipo 1 - também conhecido como diabetes infanto-juvenil ou insulinodependente.
"O diabetes tipo 1 é uma doença autoimune: o próprio sistema imunológico do paciente ataca as células produtoras de insulina no pâncreas. Quando os sintomas começam a aparecer, é sinal que aproximadamente 80% das células já foram danificadas", explicou Maria Carolina de Oliveira Rodrigues.
Maria Carolina, juntamente com seus colegas Belinda Pinto Simões e Carlos Eduardo Couri, está trabalhando para tentar interromper o processo de destruição do pâncreas que ocorre em portadores de diabetes tipo 1 por meio de um transplante de células-tronco hematopoiéticas retiradas da medula óssea do próprio paciente.
Segundo a pesquisadora, se o processo de destruição for interrompido e as células restantes forem preservadas, é possível que o paciente consiga se livrar da dependência de insulina ou pelo menos diminuir as doses.
"Não falamos em cura, mas em facilitar o controle da doença e evitar complicações crônicas do diabetes, como retinopatia, nefropatia e neuropatia", disse Maria Carolina.
Primeiros resultados
Com esse objetivo, foi iniciado em 2004 um primeiro protocolo experimental com 25 pacientes.
Eles passaram por um procedimento para coletar e isolar células-tronco hematopoiéticas da medula óssea, que foram congeladas. Em seguida, foram submetidos a uma quimioterapia agressiva para destruir o que restava da medula e de todas as células do sangue.
"O objetivo é zerar o sistema imunológico, fazendo com que ele pare de agredir o pâncreas. Em seguida, infundimos as células-tronco congeladas para que elas produzam uma nova medula e novas células sanguíneas", disse Maria Carolina.
Três dos 25 pacientes permanecem até hoje livres de insulina.
Outros 18 tiveram de voltar a tomar o hormônio após um período que variou entre seis meses e cinco anos, mas recebem atualmente doses menores do que antes do tratamento.
Outros quatro pacientes não conseguiram se livrar da insulina e nem reduzir a dose.
"Três deles tinham histórico de cetoacidose, uma complicação comum em pacientes com estágio avançado da doença. Provavelmente, esses voluntários que não reagiram ao tratamento já não tinham mais células produtoras de insulina para serem salvas", contou Maria Carolina.
Agora a equipe está fazendo novos testes, com uma dose maior.
Células mesenquimais
Paralelamente, em outro protocolo experimental iniciado em 2008, os pesquisadores tentaram modular o sistema imunológico de oito pacientes diabéticos por meio de aplicações de células mesenquimais.
"Essas células estão presentes em praticamente todos os órgãos do corpo humano e auxiliam no suporte dos tecidos, ajudam na nutrição e produzem fatores de crescimento. Nós as retiramos da medula óssea apenas para facilitar a coleta", disse Maria Carolina.
Nesse caso, as células mesenquimais são retiradas de um parente do paciente diabético. A expectativa dos cientistas é que elas consigam combater a inflamação no pâncreas e ajudar na regeneração do órgão.
"Existe ainda uma terceira hipótese, menos provável, de que as células mesenquimais seriam capazes de migrar e de se diferenciar em células do pâncreas produtoras de insulina. Isso ainda precisa ser estudado", disse.
A resposta, no entanto, não foi animadora nos primeiros pacientes tratados e a equipe pretende iniciar um novo experimento em 2013. "A ideia é aplicar quantidades maiores de células mesenquimais. Como é um tratamento de baixa toxicidade e não envolve quimioterapia, poderemos testar em pacientes entre 5 e 35 anos", disse Maria Carolina.
Ilhotas pancreáticas
Já a equipe da professora Mari Cleide Sogayar está usando uma estratégia diferente.
O grupo está encapsulando as ilhotas pancreáticas - conjuntos de células produtoras de insulina - com um material biocompatível capaz de evitar a rejeição após ser aplicado no organismo do diabético.
"O método tem funcionado muito bem nos testes com animais. Implantamos ilhotas de ratos em camundongos para provar que a cápsula é mesmo capaz de evitar a destruição das células pelo sistema imunológico", disse Sogayar.
As cápsulas contendo ilhotas de rato são implantadas no peritônio, membrana que reveste a parte interna da cavidade abdominal e recobre órgãos como o estômago e intestino. "Evitamos mexer com o pâncreas, pois ele é muito sensível e se inflama com facilidade. As ilhotas passam a produzir insulina em outra região", explicou.
Após o tratamento, os camundongos diabéticos livraram-se completamente da insulina, segundo Sogayar.
"Depois de 250 dias, retiramos as cápsulas dos animais por meio de uma lavagem do peritônio e conseguimos mostrar que as ilhotas estavam intactas. Os camundongos, por outro lado, voltaram a ficar diabéticos", disse.
Como um camundongo vive aproximadamente um ano, é possível afirmar que o tratamento mostrou eficácia por quase toda a vida do roedor. "Mas em humanos, se for necessário, as cápsulas podem ser substituídas depois de algum tempo", disse a pesquisadora.
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