Ciência do livre arbítrio
Os neurocientistas não conseguiram ainda provar e nem confirmar o livre arbítrio, apesar das inúmeras tentativas em sua abordagem clássica de tentar descobrir como o livre arbítrio funciona no cérebro.
As questões que esses cientistas se colocam são do tipo: "Uma pessoa toma decisões diferentes porque está com fome ou com frio?", "Será que o processamento de sinais corporais internos pelo cérebro interfere em nossa capacidade de agir livremente?"
Essa linha de pensamento está no centro das pesquisas científicas que questionam nossa capacidade de agir com base no livre arbítrio basicamente porque o paradigma da ciência moderna é que somos uma máquina, uma máquina bem sofisticada, é certo, mas ainda assim algo inteiramente mecanicista.
É claro que os cientistas não trabalham no vácuo e encontram boas razões para seguir nessa linha: Já sabemos, por exemplo, que os sinais internos do corpo, como os batimentos cardíacos, afetam nossos estados mentais, o que pode ser usado para reduzir a percepção da dor.
O que eles demonstraram agora é que é mais provável que você inicie uma decisão voluntária quando está expirando do que quando está inspirando. E eles usaram esse resultado para afirmar que o livre arbítrio não é assim tão livre, podendo ser influenciado por um movimento interno do corpo, a respiração.
"Nós demonstramos que a ação voluntária está realmente ligada ao estado interno do seu corpo, especialmente com a respiração e a expiração, mas não com outros sinais corporais, como os batimentos cardíacos," disse o professor Olaf Blanke, da Escola Politécnica Federal de Lausanne (Suíça), acrescentando que os resultados propõem um novo ponto de vista em um debate neurocientífico que já dura quase 60 anos, sobre o envolvimento do cérebro humano no livre arbítrio.
Potencial de prontidão
No centro dessas pesquisas e desses resultados está o potencial de prontidão, um sinal de atividade cerebral observado no córtex humano que aparece não apenas antes do movimento voluntário dos músculos, mas também antes que alguém se conscientize da intenção de se mover.
Ou seja, o potencial de prontidão é a assinatura da ação voluntária, uma vez que aparece consistentemente nas medições da atividade cerebral imediatamente antes dos atos de livre arbítrio, quando você decide se quer fazer algo ou não.
Mas não há consenso entre os cientistas, com as interpretações do potencial de prontidão sendo objeto de debate há décadas. Alguns o interpretam para mostrar que o livre arbítrio é uma ilusão, uma vez que o potencial de prontidão precede a experiência consciente do livre arbítrio, parecendo mostrar que o cérebro se compromete com uma decisão antes mesmo de estarmos conscientes de termos tomado essa decisão.
Mais recentemente, sugeriu-se que o potencial de prontidão poderia ser um efeito artificial introduzido pela medição, potencialmente colocando o livre-arbítrio de volta ao nosso comando.
Mas, como a ciência moderna, e as neurociências em particular, consideram que nossas decisões conscientes surgem de uma cascata de neurônios disparando, a origem do potencial de prontidão pode fornecer informações sobre os mecanismos que levam à ação voluntária e ao livre arbítrio. A maneira como os neurônios do cérebro trabalham juntos para tomar uma decisão ainda é pouco compreendida, é claro, mas a tentativa é de demonstrar que nossa experiência consciente do livre arbítrio, nossa capacidade de tomar decisões livremente, pode ser intricadamente conectada ao resto do corpo.
Livre arbítrio e respiração
Os novos resultados sugerem que a origem do potencial de prontidão está ligada à respiração, fornecendo uma nova perspectiva sobre as experiências do livre arbítrio, uma perspectiva que propõe que o ciclo regular da respiração faz parte do mecanismo que leva à tomada de decisão consciente e a atos de livre arbítrio.
Esses resultados e interpretações sugerem que o padrão respiratório pode ser usado para prever "quando" as pessoas iniciam ações voluntárias - mas não "se" ou "como".
Com tantas incertezas e interpretações, fica a cargo do seu livre arbítrio decidir se você aceita estas pesquisas como referindo-se ao livre arbítrio "real" ou apenas a seu aspecto motor, que começa a operar depois que sua mente tomou a decisão, o que parece ser muito mais rápido do que as conexões iônicas entre os neurônios podem permitir.
De qualquer forma, os cientistas veem aplicações práticas para seus resultados.
Os padrões de respiração também podem ser usados para prever o comportamento do consumidor, diz a equipe, como quando você clica em um botão ou em um link na internet. E dispositivos médicos que usam interfaces cérebro-computador poderiam ser ajustados e aprimorados de acordo com a respiração.
Outra possibilidade apontada pela equipe é que o acoplamento ação-respiração poderia ser usado em ferramentas de pesquisa e diagnóstico para pacientes com défices no controle voluntário da ação, como distúrbios obsessivos compulsivos, doença de Parkinson e síndrome de Tourette.
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