Insensibilidade à dor
Pessoas que não sentem dor podem ser a chave para a descoberta de novas classes de analgésicos.
Com base nessa ideia, a professora Deborah Schechtman e sua equipe da USP analisaram mutações genéticas em pacientes com insensibilidade congênita à dor com anidrose (CIPA) e identificaram proteínas modificadas que impedem a transmissão do impulso doloroso.
A partir dos dados obtidos, eles desenvolveram um peptídeo, chamado TAT-pQYP, que apresentou efeito analgésico em um modelo animal de dor inflamatória. Os resultados são tão marcantes que a descoberta mereceu a capa da revista científica Science Signaling.
"Pessoas que têm mutações no receptor do fator de crescimento neural (NGF) não sentem dor. Fizemos um estudo detalhado das mutações descritas na literatura para essa doença e modelamos os efeitos das diferentes mutações encontradas em pacientes. Ao entender o que acontece com pessoas que não sentem dor, podemos mimetizar essa situação para tratar quem sente dor e também tentar uma inibição mais específica para algum processo, evitando efeitos colaterais," afirma a professora Débora.
"Os analgésicos usados hoje para dor crônica são moduladores da neurotransmissão, no caso dos antidepressivos e dos anticonvulsivantes, ou moduladores da resposta inflamatória, no caso dos anti-inflamatórios. Nosso peptídeo é diferente, ele modula diretamente uma via de dor. Nossa intenção é modificar como o cérebro interpreta a dor, modificando como os impulsos dolorosos vão entrar no sistema nervoso," detalhou a professora Camila Dale, coautora do trabalho.
Rumo a um medicamento
A insensibilidade congênita à dor com anidrose (CIPA) é uma doença autossômica recessiva rara que tem como principais sintomas a falta de percepção da dor sensorial e a incapacidade de suar. Como a dor física tem função protetora, sendo fundamental para nossa sobrevivência, é comum que pessoas com essa doença morram na infância, por lesões ou doenças não percebidas.
Enquanto isso, algumas estimativas dão conta de que 10% da população adulta mundial tem alguma forma de dor crônica. Em pacientes com dores crônicas, a modificação e deterioração das vias nociceptivas, que transmitem os estímulos dolorosos, faz com que os remédios muitas vezes não funcionem adequadamente, ou ainda percam efeito com o tempo.
A equipe projetou seu peptídeo para que ele fosse permeável à célula. "Vimos que o peptídio reverte a dor nos animais provocada por estímulos mecânicos e térmicos, por um período prolongado. Temos um peptídeo que modula uma das vias mediada pelo NGF e pode funcionar para dor tanto aguda quanto crônica," disse Camila.
O próximo passo será determinar a melhor formulação terapêutica do peptídeo. "Nossa intenção é dividir esse trabalho com a indústria farmacêutica, para podermos desenvolver um produto. Como ele é uma molécula pequena, acreditamos que possa ser usado em formulações como pomadas, em apresentações tópicas, para ser absorvido pela pele. Achamos que ele vai ter uma eficácia diferenciada em termos de efeito para a dor," concluiu Camila.
Ver mais notícias sobre os temas: | |||
Dores Crônicas | Desenvolvimento de Medicamentos | Sistema Nervoso | |
Ver todos os temas >> |
A informação disponível neste site é estritamente jornalística, não substituindo o parecer médico profissional. Sempre consulte o seu médico sobre qualquer assunto relativo à sua saúde e aos seus tratamentos e medicamentos.
Copyright 2006-2024 www.diariodasaude.com.br. Todos os direitos reservados para os respectivos detentores das marcas. Reprodução proibida.