Determinantes do sucesso e do fracasso
A eficácia da resposta dos países à covid-19 tem sido medida pelo número de casos e de mortes pela doença, assim como pelo "achatamento da curva", termo que faz referência à necessidade de retardar a disseminação do novo coronavírus para evitar o colapso do sistema de saúde.
No entanto, um grupo internacional de pesquisadores pretende ir além desses indicadores e discutir como e por que os países adotaram determinadas estratégias para enfrentar a pandemia e, assim, entender o que possibilitou ou impediu que suas respostas fossem bem-sucedidas.
O estudo, coordenado por pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, vai virar um livro com análises comparativas entre países e regiões. O projeto prevê ainda a coleta de dados primários durante a pandemia e a criação de um repositório que sirva como base para estudos futuros - com informações coletadas de jornais, mapeamento dos principais atores políticos, comunicação dos governos e sobre como foram formuladas as políticas públicas.
"Vou colaborar com a análise comparativa entre todos os países e também com o capítulo sobre o modo de enfrentamento brasileiro. O Brasil tinha tudo para dar uma boa resposta à pandemia, mas, infelizmente, não o fez. Temos infraestrutura de pesquisa e saúde relativamente robustas, além de um histórico positivo de combate a epidemias, como as causadas pelos vírus HIV, da Aids, e zika. Talvez um dos principais problemas tenha sido o negacionismo científico", afirma Elize Massard da Fonseca, coordenadora da pesquisa.
De acordo com Elize, desde o ano passado ações no âmbito das relações internacionais e também problemas com a divulgação dos dados de desmatamento já haviam sinalizado um certo descrédito em relação à ciência.
"É possível notar semelhanças entre a condução da pandemia e do meio ambiente. Já havia um discurso contrário à questão climática e era dada uma maior importância ao eventual desenvolvimento econômico da Amazônia do que à conservação. São discursos parecidos de desprezo à ciência e de uma hipotética oposição desses fatores à economia, algo que em nenhum dos casos tem fundamento estabelecido," afirmou.
Confiança nas informações
A questão dos dados é outro problema, que se tornou central, de acordo com a pesquisadora: "Informações confiáveis são essenciais para o planejamento e a transferência de recursos em saúde. No caso da covid-19, isso é ainda mais importante. É preciso ter dados quase em tempo real para a tomada de decisões rápidas, como o afrouxamento da quarentena ou a compra de equipamentos."
Segundo a pesquisadora, o país sempre dispôs, desde a redemocratização, de dados epidemiológicos e de vigilância sanitária confiáveis, que permitiam mapear as diferenças e as necessidades regionais - entre elas as relacionadas ao enfrentamento de doenças e epidemias como a Aids.
"Temos vários sistemas de informação e monitoramento de doença infecciosa regionalizados que incluem informações de planejamento. Com isso, já se sabia quais regiões teriam maior dificuldade de enfrentar a pandemia e, a partir dos dados contidos nesses sistemas de informação tão completos, desenhar políticas públicas específicas para essas regiões," diz.
A pesquisadora ressalta que, embora exista muita dificuldade para obter dados, uma das vantagens de fazer pesquisa no Brasil está na confiabilidade das informações disponíveis. "Esse período é uma exceção no Ministério da Saúde, que, desde a redemocratização, tem sido composto por um quadro bastante técnico, apesar de serem, em muitos casos, cargos de confiança. Isso não é achismo, é baseado em dado de pesquisa do nosso grupo, que tem levantado o perfil de ministros, secretários e diretores de áreas desde os anos 1980. São quadros que tendem a ser da área de saúde, que conhecem o sistema de saúde e entendem a importância e a necessidade desses dados", diz.
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