26/05/2014

Dupla mastectomia feita sem indicação em 70% dos casos

Redação do Diário da Saúde

Sobretratamentos

Crescem os alertas de parte da comunidade científica mais preocupada com alguns descaminhos tomados pelas práticas envolvendo o câncer de mama.

Com um mau uso da bandeira da prevenção, e amparados em uma mídia pouco preparada para avaliar os resultados dos estudos médicos, o que se tem visto é uma divulgação de procedimentos médicos sem embasamento científico, muitas vezes colocando as mulheres em situações de risco desnecessários.

O alerta agora está sendo feito pela equipe da Dra Sarah Hawley, da Escola de Medicina da Universidade de Michigan (EUA), mas envolvendo não exames preventivos, e sim cirurgias radicais, eventualmente oferecidas como "preventivas".

Segundo a equipe, muitas mulheres diagnosticadas com câncer em uma mama estão sendo submetidas à mastectomia profilática contralateral (MPC) para remover os dois seios, embora poucas dentre elas tenham um risco clinicamente significativo de desenvolver câncer em ambos os seios.

O problema parece ter aumentado depois que a atriz Angelina Jolie anunciou a retirada dos dois seios por ser portadora de uma mutação genética que a colocaria em uma situação de "risco aumentado".

Mastectomia profilática contralateral

A Sociedade de Oncologia Cirúrgica sugere que a MPC (mastectomia profilática contralateral) seja considerada uma opção para uma minoria de pacientes com maior risco médio de desenvolver câncer nas duas mamas, especialmente pacientes com uma mutação genética ou histórico familiar forte, com pelo menos duas parentes de primeiro grau já tendo sofrido do problema.

O grupo realizou uma pesquisa com 2.290 mulheres diagnosticadas com câncer de mama, acompanhando-as durante quatro anos.

A maioria das pacientes (68,9%) que se submeteu à MPC não apresentava os fatores de risco genéticos ou familiares.

Entre as mulheres que retiraram os dois seios, 80% afirmaram que fizeram o procedimento para evitar o câncer de mama na outra mama.

Segundo a equipe da Dra. Sarah, contudo, a remoção da outra mama não tem demonstrado aumento na sobrevivência das pacientes.

Decisão das pacientes?

"A taxa crescente de MPC tem motivado alguns cirurgiões a questionar se executar uma cirurgia ampla que não é clinicamente indicada seria justificado para reduzir o medo de recorrência da doença. Uma maior atenção dos cirurgiões, juntamente com ferramentas de decisão dirigidas às pacientes para ajudar no fornecimento de informações de riscos e benefícios, e para facilitar a discussão, poderiam reduzir a possibilidade de sobretratamento no câncer de mama,", dizem a Dra. Sarah e colegas no artigo publicado na revista JAMA Surgery.

O que surpreende, mesmo neste estudo que alerta as mulheres para conversar com seus médicos e discutir seus casos particulares, é que os pesquisadores passam todo o ônus do sobretratamento para as pacientes, usando termos como "As mulheres decidiram realizar a cirurgia", e não algo como "As mulheres receberam de seus médicos a indicação da cirurgia".

A própria revista médica emitiu uma opinião editorial sobre o tema e os resultados deste novo estudo.

"A tomada de decisão envolvendo a prevenção do câncer de mama, com relação à MPC em particular, oferece uma oportunidade para incentivar uma abordagem de decisão compartilhada e com assistência [às mulheres]. Não apenas os prós e contras de diferentes opções de tratamento devem ser comunicados, mas é preciso levar em consideração as circunstâncias e as percepções pessoais da paciente, ao mesmo tempo levando em conta a ansiedade e as preocupações sobre a recorrência do câncer de mama e uma nova doença primária (e a distinção entre as duas). Encontrar o equilíbrio para esse problema, assim como o próprio processo de decisão, deve ser uma meta compartilhada igualmente por médicos e pacientes," diz o editorial, assinado pela Dra. Shoshana Rosenberg.

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